Nesta página, o Professor Romboedro publica as opiniões dos leitores que lhe parecem pertinentes.

Olá, Professor

O Sr, por acaso, já ouviu falar de Navalny? Morreu em uma prisão na Sibéria em tais circunstâncias que o amigo Putin se recusa a liberar o corpo para a família. Provavelmente, a fim de poupar à pobre da mãe uma despesa extra, irá entregar diretamente as cinzas. Das quais não se poderá deduzir de que forma morreu Navalny. E o Senhor ainda acha que é possível negociar com Putins e Lavrovs? Lastimável.

Cordialmente, seu muito apreciador

Zé Bedeu

Estimado Professor Romboedro

Como aluno que fui do Sr., escrevo-lhe para expressar a minha perplexidade ante seu artigo recente sobre a guerra da Ucrânia. Três coisas me parecem incontroversas:

  • A Ucrânia foi invadida pela Rússia e não o contrário. A ameaça que a Ucrânia representa(va) para a Rússia estava mais nos sonhos delirantes de conquistas de território de Putin do que numa realidade militar. Aliás, ninguém esperava sequer que a Ucrânia fosse resistir ao primeiro avanço das tropas russas. Putin mesmo estava convencido de que seria um Anschluss a la Hitler, com as tropas russas sendo recebidas entusiasticamente pelos ucranianos, como libertadores de um regime militarista, nazista e corrupto. E ele entrando em Kiyv, em carro aberto, sob o aplauso delirante da população. Não esqueço as imagens de Putin, sentado a uma dezena ou mais de metros de seus conselheiros, interrogando-os sobre o que pensavam da invasão que se desenhava e humilhando aqueles que ousavam hesitar em apoiá-lo entusiasticamente.
  • A Rússia de Putin é um estado autocrático e repressivo, onde não há separação de poderes, não há liberdade de expressão e quem ousa se sublevar ou é assassinado ou é despachado para algum Gulag. Os jovens que, logo após a invasão, votaram com os pés, saindo o mais rapidamente possível da Rússia, mostram que o regime de Putin é um regime maléfico e que o mundo estaria melhor sem ele. Para um país, como o Sr tão bem mostra, que já tem uma demografia desfavorável, a perda de uma centena de milhares de talentos jovens, não é algo desprezível.
  • É verdade que a melhor maneira de acabar com uma guerra é a capitulação, mas fiquei chocado em ver meu Mestre defender uma capitulação da Ucrânia em nome da paz e do fim do sofrimento do heroico povo ucraniano.

Em resumo, meu caríssimo Mestre, não entendi nada. Não lhe reconheço naquele artigo e espero que, em breve, o Sr. nos explicará mais claramente a sua posição.

Abraços de seu sempre

Estudante Romboedrinho.

Meu caro Romboedrinho

 

É sempre um prazer ter notícias suas e ver que você continua o mesmo jovem inteligente e sensível de quem aprendi mais do que lhe ensinei. Suas observações sobre a guerra da Ucrânia, Rússia e Putin não são assim tão diferentes das minhas. Putin é uma excrescência humana e seu regime um horror. Infelizmente, não podemos ignorá-lo. Por isso, vou concentrar-me em apenas um ponto: a capitulação.

Não estou propondo uma capitulação – uma negociação de paz não é a mesma coisa que uma rendição. É preciso atentar para o momento e as condições. Meu temor é que a Ucrânia se enfraquece rapidamente em termos de material de guerra e em termos da moral de sua população e de seus soldados. Dois anos de guerra ininterrupta já representam a metade da duração da Primeira Guerra Mundial e nós sabemos que consequências nefastas ela teve e ainda tem, mais de 100 anos após haver terminado.

Os “aliados” da Ucrânia nunca foram muito convincentes nos atos, apesar de falarem bonito. Basta ver as hesitações da Alemanha em armar o país – o episódio dos 5.000 mil capacetes é emblemático. Por si só, a Ucrânia não tem capacidade de produção de armas e munições para enfrentar a Rússia. As risíveis sanções ocidentais contra o regime de Putin (devo lembrar-lhe que, por exemplo, o Brasil é um dos maiores importadores de diesel da Rússia?), por outro lado, em pouco ou nada afetaram a indústria bélica russa. Com a Ucrânia sem armas e com soldados desgastados, o que Putin, que não é burro, percebe claramente, o que faz a Rússia? Prossegue com uma guerra de atrito em que ela detém as melhores cartas.

Minha posição é de que é chegado o momento de reconhecer que, desta feita, não há condições de derrotar a Rússia. Não há condições porque a OTAN não quer enfrentar o país no campo de batalha. Faz bem, faz mal? Do ponto de vista ético, talvez faça mal. Mas do ponto de vista de uma Realpolitik de paz (ainda que provisória, como toda paz), faz bem.

Há dois pontos que você não menciona explicitamente, mas que devem estar nos seus pensamentos. O primeiro são os mortos, os aleijados, as famílias destruídas pela perda de um pai, uma mãe ou filhos, as casas e infraestruturas bombardeadas, todo este preço quase infinito de dor pago pelos ucranianos, para quê? O segundo, é como se pode negociar com um canalha como Putin? Que confiança de pode ter em um homem que manda matar seus adversários políticos do mesmo sangue que ele? Quanto ao primeiro, lembro o pragmatismo algo cínico dos anglo-saxões: cut your losses and run! Quanto mais tempo durar a guerra, maiores serão as perdas. O segundo ponto é o mais difícil. Para enfrentar Putin, a força combinada dos aliados da Ucrânia, que não parecem estar assim tão disposto a ajudar. Uns querem a continuação da guerra a qualquer preço (para os outros, não para eles), outros não querem comprar briga com o ditador. Gostaria de ter uma varinha mágica para lhe dizer: é assim que se faz! Como trazer o ditador para a mesa de negociação se ele sente que basta ficar com a bola parada para ganhar o jogo? Honestamente, não sei.

A alternativa parece-me ser uma guerra que será ganha pela Rússia. Ou uma guerra que levará ao envolvimento da Europa e, por extensão, do resto do mundo. A diplomacia europeia faria bem de começar a seduzir o resto do mundo que está ao lado do Putin e construir com eles a pressão para um acordo de paz.

E, é com esta triste nota triste que despeço-me de você. Vamos torcer juntos pela melhor solução possível.  

Com a típica arrogância dos antilectuais de nossas universidades, o Professor profetiza, não, vai além, demonstra matematicamente, a vitória do Mal sobre o Bem e o fim de uma guerra sobre a qual ele não sabe nada. É o derrotismo dos que nunca passaram fome na vida. Como diz meu neto: “Awww! Come on!” Em tradução livre para a língua do Professor: “Não encha o s…!” Vá cuidar de suas galinhas!

Democrata (e Republicano)