O paradoxo da educação 1

 

  •                   Máximas mínimas. (Perdoe-me Millôr se lhe cito erradamente, mas acho que você disse isto muito antes mim.)
    • Educação: o que sobrou depois que você esqueceu tudo que as professoras e os professores lhe ensinaram na escola. Veja bem: “lhe ensinaram” e não “aprendeu”. Ensino e aprendizado não são a mesma coisa.
    • “Burrice não tem cura, ignorância sim.” Admoestação predileta e verdadeira de um professor da infância do autor, cuja profunda sabedoria (a da infância) permanecerá, infelizmente, anônima. O autor ainda hoje suspeita de estar na primeira categoria. Evidências não lhe faltam.
    • “A burrice não só não tem cura, como PIORA com o tempo.” Constatação empírica do autor.
    • Atenção: Não confundir! O Ensino é a tentativa de curar a Ignorância. O Aprendizado é o sucesso da cura

 

Muitos estudiosos do assunto sugerem que a alfabetização na Europa Ocidental foi promovida pela Reforma de Lutero e das igrejas e seitas que dela surgiram, não a menos importante das quais teria sido o Calvinismo. Convenientemente, ela foi útil como ferramenta do capitalismo protestante nascente por promover a qualificação da mão-de-obra, cada vez mais necessária à medida em que o próprio capitalismo era transformado em instrumento de salvação da alma. Como diz Max Weber, o ascetismo monástico foi convertido pelos protestantes em um ascetismo de acumulação de riqueza (ganhe, mas não gaste a não ser em boas causas). Segundo ele, o capitalismo protestante foi uma transposição do ascetismo FORA de mundo (ausserweltlich) das ordens monásticas, para outro tipo, NO mundo (innerweltlich). Como nada é tão bem-sucedido como o sucesso, à medida que a riqueza crescia, as gerações seguintes foram esquecendo o ascetismo (ninguém é de ferro, sobretudo quando pode ser de ouro) e a componente religiosa foi desaparecendo da racionalidade capitalista. É sempre a mesma coisa: nenhuma boa ideia fica impune para sempre. O filho devorou a mãe.  Dirá o leitor mais cético, que a cupidez humana sempre foi o motor primeiro da acumulação da riqueza. Mas, isto seria ignorar a transformação que a Reforma de Lutero operou na religiosidade da Europa Ocidental. Pode tudo ter sido uma tempestade perfeita: Reforma, alfabetização, explosão do capitalismo racional de acumulação de ganhos. O curioso é que nem o sentimento religioso (com certeza tendo assumido uma outra forma), nem o capitalismo (que existia há muito tempo, mas não da forma obcecada e racional que adquiriu a partir do século XV na Europa Ocidental) eram coisas novas. O elemento realmente distintivo, antes inexistente foi a alfabetização em massa, esta sim, notável nas regiões que adotaram o protestantismo.

A primeira Figura abaixo mostra a situação de alguns países “early adopters” na Europa Ocidental, cobrindo o período 1475 até 1750. Aqui cabem duas notas caucionárias. A primeira é que são dados obtidos de forma muito indireta e, portanto, com barras de erro respeitáveis, que o autor desconhece. A segunda é que saber LER não é o mesmo que saber ESCREVER. Como diriam os matemáticos, saber ler é condição necessária, porém não suficiente para saber escrever.

A Figura a seguir mostra a situação para poucos “late adopters”, inclusive o Brasil, cobrindo o período de 1750 até hoje.

O leitor interessado em maiores informações deve consultar o link:

https://ourworldindata.org/literacy

 

Fonte: World Bank (2023); Various sources (2018) – processed by Our World in Data. “Historical and more recent literacy estimates” [dataset]. World Bank, “World Bank Education Statistics (EdStats) 2023”; Various sources, “Cross-country literacy rates” [original data].
Taxa de alfabetização entre 1475 e 1750 na Holanda, Reino Unido, Alemanha e França. A estabilização da taxa de alfabetização no Reino Unido entre 1650 e 1750 não está explicada na fonte (secundária) dos dados. A Alemanha, enquanto nação, não exisita no período mencionado. Portanto, é de se supor que seja um índice composto por informações sobre várias regiões.

 

Fonte: World Bank (2023); Various sources (2018) – processed by Our World in Data. “Historical and more recent literacy estimates” [dataset]. World Bank, “World Bank Education Statistics (EdStats) 2023”; Various sources, “Cross-country literacy rates” [original data].

 

A alfabetização, por pior medida que seja, está relacionada com a riqueza das nações e sua expansão acompanha aquilo que percebemos como sendo o progressivo desenvolvimento dos povos. Na sua sequencia, em especial a partir do século XIX, desenvolve-se o ensino secundário (ginasial e técnico) e o superior (muito associado à pesquisa e desenvolvimento da ciência). Mas, isto fica para um próximo post. Ou poste, como recomenda o bom português.